quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Entre as Folhas

.o mar

O roteiro do filme Entre as Folhas é uma adaptação totalmente livre de um trecho do conto de Rubem Alves, "O Retorno Eterno". O poema de Rubem tinha um título, mas propositalmente este não nos foi revelado. Também tinha alguns versos a mais, que foram cortados. Segue abaixo o que ficou:

"Leia este poema vem devagar,

pois cada imagem

merece a preguiça do olhar:

No mistério do Sem-Fim;

equilibra-se um planeta.

E, no planeta, um jardim,

e, no jardim um canteiro:

no canteiro, uma violeta,

entre o planeta e o Sem-fim,

A asa de uma borboleta.


É pequeno, mas diz tudo.

Nada lhe falta. Uni-verso.

Nenhuma palavra lhe

Poderia ser tirada.

Assim se faz um poema,

Com palavras essenciais.

O poema diz o essencial.

O essencial é aquilo que,

Se nos fosse roubado,

Morreríamos.

O que não pode ser esquecido.

Substância do nosso corpo

e da nossa alma."

(Rubem Alves, in “O Retorno e Terno”)


Ispirados (apenas inspirados, não baseados) no poema e (aí, sim) baseados em suas vivências pessoais, cada aluno deveria fazer um roteiro para vídeo (máx. 5min de duração) e um deles seria escolhido para ser produzido pela turma toda.

Assim que a professora informou o fato de usar os elementos do poema não literalmente, mas como metáforas de alguma outra coisa, pus-me a pensar. Logo que terminei minha leitura a imagem de uma garota ruiva boiando numa lagoa me veio à mente e com ela fiquei - seria minha borboleta.

Depois dela, o elemento que mais poderia se tornar clichê: o Infinito. Como não imaginar o céu? Preferi complementar: porquê não imaginar dois infinitos? Céu e mar... O planeta, uma praia.

Não vou avançar contando sobre todas as outras cenas que fui imaginando separadamente para depois juntar numa narrativa e dar, por fim, um sentido.

Me deterei ao mar, título-mor dessa postagem: sempre o comparei à vida, tão imenso e misterioso, imprevisível, surpreendente. Uma imensidão da qual não se vê o fim.

Mas poucos dias após ter meu roteiro escolhido, descobri que a maneira com que eu havia retratado o mar naquela narrativa dava total abertura a interpretações completamente diferentes: nossa professora via o mar como a morte. Outra coisa tão incerta e tão devastadora como a vida. Na visão dela, minha protagonista terminara olhando para o mar porque certamente morrera.

Incrível como uma única coisa pode ser vista de maneiras tão opostas. O fato é que fazia sentido, e muito. Assim como a morte, o mar pode ser uma força devastadora que de uma hora pra outra leva embora tudo o que estiver perto e aquilo nunca mais retornará.

Realmente, em minha história o mar pode realmente representar a morte. Ele destruiu as paredes do quarto, levou os livros, os remédios, a cama, tudo foi carregado para o inalcansável fundo dos oceanos...

Exceto a garota.

Se há uma maneira de crer que aquela cena final indique que Pérola morreu, não é por meio de mitologias ou por causa do mar - isso dependerá do que você entende por morte.

Naquele mesmo dia, nossa professora ministrou uma palestra sobre "A jornada do Herói", uma teoria junguiana usada na construção de personagens para um roteiro. O passo final da jornada seria exatamente a "morte" do herói em seu velho mundo para que ele pudesse "nascer" em um mundo novo.

No filme vemos um "mundo" que é destruído pelas águas. Ao invés de morrer para aquele mundo, Pérola quase escolheu morrer com aquele mundo...

Quase. E o que a impediu?

Você vai ter que esperar pra assistir ;)

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